ARTUR RIOS
Artur Rios é formado em Artes Plásticas (UFBA), e pós graduado em Arteterapia (IJBA).
Seu enfoque está na pintura, tendo como pesquisa o corpo do animal, frequentemente colocando-o em ambientes humanos como provocação literal na ecologia e simbólica na relação com o selvagem.
Produz uma série também de figuras humanas, tendo optado pela forma do corpo feminino mesclado a elementos da natureza.
Mantém a coerência ao representar corpos diferentes ao do próprio artista.
Já participou de exposições coletivas e individuais em estados como São Paulo, Piauí, Bahia e Goiás, tendo sido já premiado no Salão de Artes Visuais da Bahia, ed. Paulo Afonso, em 2014.
Já realizou exposição no Seattle Erotic Art Festival em 2021 e 2022, nos EUA. Tem obras vendidas para diversas regiões dentro e fora do Brasil.
ENTREVISTA
Como você entrou para o mundo das Artes?
Toda criança gosta de desenhar e pintar, comigo não foi diferente. Mas nem todas seguem estimuladas e interessadas pela expressão artística no decorrer da vida. Ora porque não foram apoiadas pela família, visando outras áreas que são legitimadas na sua educação, ora porque o seu entorno não apoiava a expressão artística da criança. Então aquilo acaba sendo visto como “coisa de criança”. Vejo minha família como um grande apoio ao crer no valor do fazer arte.
O que você entende como Artes Plásticas?
Entendo as artes plásticas por toda forma de expressão da matéria visual e, eu diria também, tátil. Aquilo que podemos ver ou tocar e é expresso como uma extensão da subjetividade do artista.
Como você define sua Arte?
Acredito que minha arte tem similaridades técnicas com o impressionismo, tem um pé no surrealismo, é figurativa e está mais próxima da fantasia do que a realidade concreta, ainda que dialogue com esta última. Minhas pinturas não são, em sua maioria, completamente surrealistas em sua representação do improvável, pelo fato de representarem situações incomuns, embora sejam parte de uma realidade possível e já documentada. Como, por exemplo, o encontro de animais selvagens com ambientes humanos. Quando vemos fotos de flagras como estes, nossa reação é de certo espanto como se ali fosse uma alucinação, mas que é de fato algo muito real e próprio da nossa vida. De certo modo, brinco com essa linguagem própria do inconsciente, cheia de simbolismos, utilizando-me de certa espontaneidade criativa que emerge sem muito controle consciente, mas mantenho meus pés ainda com certa firmeza no chão.
Quais são suas maiores referências no mundo das Artes?
Quando criança, eu adorava bisbilhotar livros de minha mãe que apresentavam artistas do passado. Meu olhar, desde lá, sentia atração por artistas como Hieronymus Bosch (principalmente no aspecto “esquisito” de sua arte), Goya (na sua fase mais sombria e dramática, na qual me identifico com o abuso de efeito sombra/luz) e Salvador Dalí (em sua criatividade de composição). Ao decorrer da vida, diversas outras referências e influências foram aparecendo. Artistas visuais como Aleksandra Waliszewska, G. Colwell, Boris Vallejo, Oleg Vdovenko, Eliran Kantor, Joyce Lee, Julia Soboleva, Adalberto Alves e Nelson Magalhães são referências atuais que contemplo. Considero alguns jogos também como arte, pois consigo imergir e explorar significados neles, não sendo apenas mero entretenimento. Jogos como Diablo 1 sempre me inspiraram desde minha adolescência em seu aspecto sombrio e sua narrativa apocalíptica, e Skyrim inclusive tem sido usado como referência visual para compor alguns cenários da minha pintura. O Cinema também sempre foi uma grande referência e influência, e posso citar alguns filmes: O Anjo Exterminador (1962), Nosferatu (1979), Anticristo (2009) e Border (2018).
Quais são os principais temas utilizados em suas obras? E por quê?
Meu trabalho artístico fala muito de nossa relação com o animal literal e simbólico, e a relação ecológica corpo-ambiente. Refiro-me ao animal que convive no mesmo planeta que nós, e costumeiramente interpretamos sua aparição em lugares humanos como uma invasão. Ou seja, o não-pertencente entrando em território inadequado, deflagrando uma tendência de pensamento colonizador na ótica ecológica, já que podemos interpretar também que nós invadimos o espaço do animal, e compreender a necessidade de espaço que cada vida clama. Refiro-me também ao animal simbólico, como o diferente provoca nossa necessidade de linguagem comum na convivência, trazendo exercício de alteridade, e também ao que cada um pode representar com seu corpo, desde sua especificidade de espécie, como lembretes de aspectos gerais instintivos e viscerais que também existe em nós humanos. Esta mesma animalidade perpassa nos corpos humanos que pinto, normalmente numa relação simbiótica com a natureza, como se todos os elementos fossem uma só manifestação.
Quais são as principais técnicas utilizadas em seu trabalho? E quais delas você mais gosta de utilizar?
Frequentemente, misturo a tinta diretamente na própria tela e ressalto a direção da pincelada, como é bem comum em pintores do Impressionismo, em vez de misturar no godê e depois transferir. Faço isso de uma forma bastante particular em algumas situações, tanto que, de forma humorada, chamo essa técnica de “embolato”. Faço pontos soltos na tela com diversos tons, e os misturo de modo que se crie certa textura, e que a mistura não seja perfeita, criando um espectro de tons interessante e uma textura sedutora. Enfatizo a direção da massa da tinta, e não somente o desenho bidimensional da forma pura. Como se tirasse proveito de sua textura e chegasse a se aproximar de um baixo relevo.
O que você busca passar através de suas obras para o espectador?
Busco palavras que atravessem o espectador como o selvagem, o sensual, o misterioso e o simbólico. O selvagem é explorado principalmente no corpo, que por sua vez já leva ao sensual, na forma de representar os pelos ou a pele, explorando bastante a textura da tinta nas pinturas, como uma sedução tátil. O misterioso e o simbólico andam juntos, pois uma composição que traga um significado sem solução, que instigue o observador a querer entender, é um convite ao simbólico, como um campo relacional a ser explorado e conhecido. Sempre busco trazer uma áurea de mistério nos meus trabalhos, pois a tarefa de desvendá-los torna tudo mais interessante.
Gosto de explorar a imagem do corpo animal de uma forma provocadora, em que a arte não se revele por si mesma, para quem tem interesse em olhar para uma imagem e deixar a imaginação fluir, explorar o simbolismo do “pode ser”, e não simplesmente aquilo que se é literalmente. Gosto de um observador que fique em frente ao meu trabalho e dialogue com ele, projete sua percepção de vida naquilo que vê. É preciso meditar para se aprofundar, assim alguma coisa dentro de nós vai se encaixando.
Um lado meu gostaria de ampliar a mente e subjetividade do espectador. Nos meus trabalhos há uma certa ode à vida em sua amplitude, o que aumenta a sensibilidade à vida e à natureza em sua originalidade. Outro lado meu sabe que não tenho controle sobre isso, e as pessoas vêem o que bem quiserem em meu trabalho. De modo geral, tenho fé de que haverá deleite com a beleza das manifestações de vida e valorização daquilo que é natural e orgânico.
Quais as melhores e maiores experiências em sua carreira artística?
Honestamente, quando alguém demonstra um gostar verdadeiro e espontâneo do meu trabalho, e também faz um esforço para adquiri-lo, isso é o que considero como a melhor experiência para mim. Participar de editais, seleções e exposições é uma forma de trazer sentimento de merecimento para mim em relação ao mundo, mas a troca pessoal real e direta me faz sentir na pele de forma mais sensível que vale a pena compartilhar meu trabalho.
Em sua obra existe um cunho de protesto além do que se é obviamente visto? Se sim, qual? Se não, há algum tema que desperte a sua vontade de protestar?
Ao ver meu trabalho, é possível se sentir questionado sobre a relação do corpo e o ambiente que vive (ecologia), o pensamento colonizador e territorial, e o animal simbólico que se manifesta em nossas vidas de modo inconsciente e instintivo. Quem define a posse de um território no planeta? Quais as formas de a vida se manifestar? A vida diferente é legítima? Como conviver com o diferente? É possível escapar de nossa própria animalidade? Como conciliar nossa moral com o nosso ser animal? Tudo que se passa a respeito do relacionamento com a natureza, o visceral e o animal, pode ser uma forma de provocação e protesto literal (aquilo que se vê) e simbólico (aquilo a que se pode atribuir significado).
Você tem interesse em fazer uma exposição itinerante? Se sim, como você imagina essa exposição? Saberia dizer qual tema gostaria de abordar?
Sim. Acredito que há dois caminhos válidos para exposição: um que subverta e procure um público desabituado ao mundo artístico, como um caminho de educação e hábito para exercitar o olhar; e outro que alcance as pessoas que normalmente circulam já em ambientes artísticos e tenham um olhar mais sensível para isso. Particularmente, prefiro o segundo caminho, mas apoio o primeiro. Os temas que costumo abordar e pesquisar despertam interesse na realização de exposições.
Aonde você almeja chegar como Artista Plástico?
Primeiramente, gostaria de sobreviver apenas com a arte que faço. Isso significa pagar as contas, ter reservas e lazer. Ainda que não seja fácil. Não posso negar essas condições primeiras que sustentam outras realizações. Gostaria também de ver meu trabalho espalhado pelo mundo, isso significa ampliar a sua circulação, de um modo que eu possa entrar em diálogos constantes com as pessoas, e saber o que há delas em meu trabalho, e o que de meu trabalho há nelas. Não tenho megalomania, gosto de dar um passo a cada dia.